MANIFESTO - para um "não gesto".

Não somos um nome, somos História.
Não somos o conjunto de parcialidade que forma um conjunto funcional, somos a união de unicidade que forma um conjunto cada vez diferente.
Não somos iguais e incapazes de nos somar, somos diferentes e exponencialmente capazes de nos unir.
Não somos só entre os outros, somos com os outros.
Não somos utilizadores de criações alheias, somos criadores de gestos próprios.
Não acreditamos em uma verdade absoluta, somos cada um a nossa verdade.
Não queremos que o mundo nos mude, queremos mudar o mundo.
Não somos média, estatísticas ou mercadorias por comprar ou vender, somos valores absolutos, experiências insubstituíveis.
A Arte não é o produto de um só indivíduo, mas o resultado da experiência humana em seu complexo.
Ninguém pode apropriar-se dos direitos da arte, porque ninguém pode apropriar-se da experiência humana na sua complexidade.
Ninguém pode apropriar-se de uma idéia, porque cada idéia é uma intuição e cada intuição é filha da História.
A arte não pode ser vendida, a arte não pode ser comprada; você pode se vender, mas não pode vender o fruto de algo que não lhe pertence.
A arte não é mercadoria para troca, a arte é uma necessidade primária do Homem, ninguém pode atribuir a ela um valor econômico.
Ninguém pode impedir o outro de criar porque a criação prescinde da vontade de cada um.
Ninguém pode elevar-se à condição de mestre, porque os mestres são escolhidos.
Ninguém pode elevar-se à condição de juiz, porque a arte não se judica.
As castas devem ser destruídas. Ninguém é escritor, diretor, ator, escultor, nem ferroviário, arquiteto, agricultor ou qualquer forma da expressão humana.
Cada indivíduo é o conjunto de tudo isso com a liberdade de escolher sua forma de expressão e reinventá-la.
Cada pessoa tem o direito de expressar-se da forma que preferir, mas tem o compromisso de refletir e compartilhar o fruto da própria expressão.
Com esse manifesto Nos pedimos a você que baixe os braços em dado instante: o instante de assinar a própria criação. Nos pedimos um "não gesto" que seja um "gesto"; claro, preciso, inequívoco.
A assinatura de uma obra é o primeiro passo, essencial, para a mercadização da obra.
Nos afirmamos um Não.
Não à assinatura da própria criação. Só dessa forma a obra não poderá ser vendida, nem excluída, por aqueles que, por ela, se sentem ameaçados.
Um não gesto como elemento desestabilizante de um sistema que não queremos e que não sentimos. Com isso não queremos criar um mundo de anônimos, mas um mundo de Pessoas que busquem no outro, um relacionamento direto com o próprio criar.
Não queremos um mar de lixo, mas um mar de idéias, no qual, livremente, iremos buscar o estímulo para a nossa criação.
Sobretudo não queremos que a desculpa do legítimo reconhecimento, o fascínio pelo sucesso, faça de Nós e dos nossos gestos o carburante que alimenta a máquina do comércio das idéias.
É uma recusa dolorida. Fere nosso orgulho treinado a medir a grandeza de uma pessoa com a pergunta "quanto?". Quanto você produz? Quanto sucesso? Quanto dinheiro? Mas Nós afirmamos a importância e a unicidade do "como". O "como" a obra é produzida e oferecida é o único fato que interessa da obra.
Não queremos que o mundo nos mude, queremos mudar o mundo.
Não se pode mudar o mundo mudando aos outros. Mudar você mesmo é o único caminho transitável.
Não assinar nossa obra é o gesto, um factível "como", que nos permite reapoderar nossas criatividades, impedindo, a quem quer que seja, inclusive nós mesmos, de consignar um valor econômico à nossa criação, que é pessoal e universal ao mesmo tempo.
Num mundo que aceita patentear uma seqüência genética, como se fosse possível assumir qualquer paternidade sobre a vida, num mundo que aceita proteger com direitos autorais um texto, uma música ou uma obra teatral, como se alguém pudesse verdadeiramente produzir algo de original, num mundo que assume o dinheiro como valor único e incontrastável, como se o dinheiro pudesse realmente ser um valor, num mundo como este nós gritamos nosso Não. E o fazemos com a única violência que aceitamos, aquela contra nosso orgulho, contra nossos pré-juízos, contra os nossos pré-conceitos.
Desse Não pode-se rir, desinteressar-se, ou, cheirando a perigo, tentar neutralizá-lo. Mas uma coisa não se pode fazer: negá-lo.
Porque esse Não existe independentemente daquilo que Nós podemos pensar. Existe desde o longínquo momento que alguém escolheu sacrificar no altar do progresso parte das necessidades primárias do Homem, e seguirá existindo até que essa parte faltante siga dormindo em cada um de nós.
A tentativa de nos transformar em homens-como-produto-de-compra-venda encontra-se em um estágio avançado e muito próximo do sucesso. Mas não é um processo irreversível.
A nossa tarefa é tentar sobreviver a isso. Tarefa da Arte é reverter o processo e fazer que o Homem, na sua integridade de necessidades satisfeitas, volte a reviver.
Officina ArtAud


Nijinsky


Porque viver não é seguir como ovelhas o curso dos eventos, na mesma rotina desse conjunto de idéias, de gostos, de percepções, de desejos, desgostos que confundimos com o nosso Eu e dos quais somos apagados sem buscar além, mais longe. Viver é superar a si mesmo.
A. Artaud


Veja também

picture

Manifesto Fundação
Os princípios fundativos de Officina ArtAud.

Officina ArtAud

Rua tupi 103, itagua, Ubatuba (SP) Brasil 11680000,
Telephone
: +55-12- 91449690
E-mail: contato@officinaartaud.org